Morte de brasileira na Indonésia e acidentes com balões no Brasil acenderam um alerta sobre a segurança da atividade. Especialistas destacam que turistas têm meios para minimizar o perigo.
A trágica morte de Juliana Marins, de 26 anos, durante uma trilha na Indonésia, reacendeu um debate sobre os riscos existentes na prática do turismo de aventura. A publicitária foi deixada para trás pelo guia. A agência de viagens que vendeu o passeio também estava banida do Parque Nacional do Monte Rijani, onde ocorreu a tragédia.
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O caso explicitou a falta de protocolos de segurança e planos de emergência, mas, infelizmente, somou-se a outras tragédias ocorridas no Brasil, também no mês passado. Em São Paulo e em Santa Catarina, dois acidentes com balões levaram à morte de nove pessoas, no total, e deixaram dezenas de feridos. Em ambos os episódios, os pilotos não estavam habilitados.
Resgate de Juliana Marins após queda em trilha de vulcão na Indonésia levou quatro dias© BASARNAS/AP Photo/picture alliance
Em 2022, cenas do desabamento de um paredão em Capitólio (MG) que matou dez turistas em uma lancha de passeio correram o mundo. Na ocasião, mesmo com o aviso de que havia risco de queda da estrutura, as embarcações demoraram para deixar o local.
Apesar de existirem normas técnicas específicas para atividades de turismo de aventura no Brasil, como trilhas, rafting, tirolesas e mergulho, o setor sofre com a falta de fiscalização e informalidade, que dificulta a qualificação de profissionais e pode refletir na segurança dos consumidores. No entanto, segundo especialistas consultados pela DW, mesmo que a ausência de perigos seja inevitável no turismo de aventura, existem meios pelos quais os turistas podem se resguardar para minimizar os riscos.
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De acordo com Luiz Del Vigna, diretor-executivo e um dos fundadores da Associação Brasileira das Empresas de Ecoturismo e Turismo de Aventura (Abeta), são três regras específicas, que foram criadas no Brasil e se tornaram regulamentações internacionais pela Organização Internacional de Normalização (ISO).
Segundo ele, a primeira delas, a ABNT ISO NBR 21101, que estabelece um sistema de gestão de riscos para quem presta o serviço de turismo de aventura, é a "espinha dorsal do processo". "Ela determina que a agência que oferte uma modalidade específica, como um circuito de trilha, por exemplo, faça os inventários dos perigos e riscos da atividade e desenvolva um plano de atendimento a emergências", afirma Del Vigna.
Por sua vez, a segunda norma técnica, a 21.102, define habilidades e conhecimentos necessários para líderes em atividades de turismo de aventura, inclusive em primeiros socorros e atendimento de emergência – o que faltou tanto nos casos de Juliana Marins, quanto nos acidentes com os balões em Boituva (SP) e Praia Grande (SC).
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Já a última regulamentação para o turismo de aventura no Brasil, a 21.103, especifica as informações mínimas que devem ser fornecidas aos participantes, antes, durante e depois da atividade escolhida. "Tem todo um descritivo do circuito e tudo o que pode dar errado ali, inclusive para que a pessoa tenha o direito de optar por não ir, caso se sinta insegura", complementa o diretor-executivo da Abeta.
Para a professora Aylana Laíssa Medeiros Borges, do Centro de Excelência em Turismo (CET) da Universidade de Brasília (UnB), essas informações são importantes para que o turista saiba inclusive o que fazer e a quem recorrer caso ocorra algum tipo de acidente. Além disso, deve haver uma comunicação pelo guia ou responsável pela atividade sobre qual o perfil do grupo de participantes.
"Por exemplo, se são atletas ou sedentários? Isso vai fazer com que a atividade seja regulada, porque não é possível imprimir em um passeio de trilha uma dinâmica de caminhada que nem todos ali consigam atender", diz a turismóloga, que lembra que outros dados, como condições climáticas e nível de dificuldade também devem estar presentes.
"Acaba sendo também uma segurança para a agência de viagens", explica Borges. Segundo ela, quando não se há uma gestão de riscos e não é levado em consideração o risco da atividade turística e do lugar onde ela é realizada, "é muito preocupante".
Em passeios de turismo de aventura pelo Brasil, não é incomum receber da agência de viagens um "termo de responsabilidade", em que a prestadora do serviço tenta se eximir de qualquer culpa caso aconteça algum problema durante a atividade. No entanto, diz Luiz Del Vigna, esse instrumento é inválido e vai contra o que está disposto na ABNT ISO NBR 21103.
"A lei obriga que se liste os riscos identificados no inventário. Esse termo de isenção de responsabilidade não existe, é absurdo. Se você tem uma empresa séria e cumpre o objetivo, vai ter um documento informando tudo", pontua o diretor da Abeta.
No entanto, o cenário se complica quando se leva em consideração as dificuldades de fiscalização sobre a implementação das normas técnicas pelos operadores de turismo. Como explica Aylana Borges, a determinação de controle é do Ministério do Turismo, mas não há identificação específica de quem faça essa fiscalização, logo, a regulação acaba ficando a cargo de denúncias.
O problema é agravado pela informalidade generalizada. De acordo com estimativas da Abeta em parceria com a Universidade Anhembi Morumbi, havia, antes da pandemia, cerca de 1.500 empresas cadastradas no Cadastur como operadoras de turismo de aventura. No entanto, Del Vigna reconhece que esse número está defasado e que o tamanho do mercado informal é incalculável.
"Quem é informal, é fora da lei. Às vezes tem no máximo um alvará de funcionamento da prefeitura, oferece turismo de aventura, mas não cumpre com a legislação porque não tem um sistema de segurança implementada", diz. Mas a certificação de uma empresa pelas normas técnicas, que em alguns casos pode custar R$ 20 mil, cria limites não só financeiros já que, sem a fiscalização, fragiliza o setor, criando distorções no mercado.
"Por exemplo, um passeio a cavalo só pode ser ofertado para maiores de 7 anos. Tem famílias com crianças menores que isso que querem fazer o passeio. Se der algo errado com o prestador certificado, ele vai preso, então ele não atende essas famílias. Então, a agência de viagem vai indicar quem não segue a norma, porque não perde o cliente, já que o poder público não fiscaliza a priori", explica.
Aylana Borges lembra que a segurança na experiência de turismo é uma corresponsabilidade, que envolve gestores públicos e privados, turistas e comunidade local. Segundo ela, esse é um dos grandes desafios da atividade no Brasil.
Em se tratando dos passeios de aventura, o turista é quem está na ponta do processo. É quem paga pelo passeio e quem pode sofrer as consequências de uma gestão de riscos mal feita ou inexistente, ressalta Del Vigna. "É fundamental que o consumidor passe a cobrar", diz o diretor da Abeta.
Um dos principais canais para verificar se um prestador de serviços ou guia contratado é regularizado é o Cadastur, do Ministério do Turismo. Pela plataforma online, o consumidor consegue acessar o cadastro de prestadores de serviços e verificar se a pessoa ou empresa está listada como regularizada pelo governo federal.
"Em termos de atuação desse profissional, temos esse aporte na legislação, que prevê fiscalização e penalidade caso não se cumpra o que está previsto em lei. É preciso que o profissional tenha curso, cadastro e, além disso, uma carteirinha do Ministério do Turismo identificando o guia", destaca Aylana Borges. De acordo com ela, é primordial que o turista peça para o profissional apresentar esse documento.
Del Vigna também lembra que é recomendável consultar os sites de avaliação online, como o próprio Google, desde que aquela não seja considerada a palavra final sobre a qualidade do serviço. "E peça informações sobre o sistema de segurança. Pergunte se é certificado – e essa é a pergunta de ouro", diz.
"O turista não está com a mão atada. Você vai colocar o seu filho, seu neto, uma pessoa amada, numa tirolesa que cruza um vale a 140 metros de altura que não for certificada?", questiona ele.
Para ambos os especialistas, mesmo que haja um déficit na comunicação por parte do poder público, o turista também tem um papel ativo na construção de experiências mais seguras. "Cabe, sim, uma educação do turista: entender que tipo de turismo ele gosta de fazer, quais cuidados precisa tomar, que riscos estão envolvidos, quais canais deve acionar e como buscar informações sobre o que está sendo ofertado", conclui a professora da UnB.
Autor: Fábio Corrêa