Deputado faz média buscando usar prefeito como muleta de seu projeto eleitoral
Após quatro anos manipulando e distribuindo recursos bilionários das emendas parlamentares, como presidente da Câmara, Artur Lira ainda vive a expectativa de assumir um ministério do governo Lula, doce sonho alimentado desde que empossou o paraibano Hugo Mota como sucessor.
Com espaço próprio na Esplanada dos Ministérios se livraria da frustração de jamais ter exercido cargos ocupados por dois implacáveis contendores: Renan pai, ministro da Justiça no governo de Fernando Henrique Cardoso, e Renan filho, atual titular do Ministério dos Transportes.
Mas a reforma ministerial não anda, Lula encara questões mais ingentes, e Lira, já dando sinais de desânimo, resolveu se concentrar no jogo político alagoano, onde perdeu espaço por inação ou por achar que a ele caberia definir posições.
O mandato de deputado lhe permitiu chegar à presidência da Câmara, graças ao apoio do Centrão obcecado por emendas, o que fez de Lira um dos personagens centrais da política nacional. Sentiu-se rei sem coroa, mas com força suficiente para escalar uma subida mais íngreme visualizando o Senado no topo.
A pretensão de pleitear o mandato de senador parece legítima – à parte suas encrencas na Justiça – o que não significa que o caminho está pavimentado. Longe disso. Senado é disputa majoritária, exige bagagem própria e composições políticas. E Lira não tem uma coisa nem outra. Por isso tem investido forte em elogios gratuitos ao prefeito João Caldas filho. Do tipo "JHC tem demonstrado competência na gestão" e "Por onde andamos há um forte clamor para que JHC venha a ser o nome do nosso grupo ao governo alagoano". Para Lira, envolver o prefeito virou ponto crucial.
Primeiro, porque ele sabe que sem um candidato a governador viável a corrida ao Senado é derrota certa. Segundo, porque, com duas vagas de senador em jogo, o desafio parece menos penoso (parece porque seu pai, Benedito de Lira, também pensava assim e acabou ‘sobrando’, em 2018, quando perdeu a disputa para Renan Calheiros e Rodrigo Cunha).
O problema é que, sem ter muito a oferecer – seu partido, o PP, elegeu apenas 27 dos 102 prefeitos alagoanos e ele próprio não tem voto na capital – Lira tenta apostar tudo no seu projeto pessoal. Isto é, não lhe incomoda o fato de que, se perder a batalha pelo governo, JHC vira um Davi Filho – fica sem mandato, sem cargo, sem nada. Ademais, o prefeito, vale citar, gosta de números e sabe que o eleitorado de Maceió é apenas um quarto do estadual. Sabe, também, que terá pela frente um adversário consagrado como um dos maiores governadores de Alagoas: Renan Filho, líder de um MDB que elegeu 65 prefeitos, cresceu após o pleito e já conta com 90 gestores, alguns inclusive originários do minguante PP de Lira.
Não é só, a contraposição impressiona: enquanto JHC contaria com um grupo de poucos prefeitos e alguns parlamentares da ALE, Renan Filho cresce com respaldo de poderosa aliança partidária comandada pelo MDB e com o apoio de mais de 20 deputados estaduais, de uma legião de vereadores, do governador Paulo Dantas, do senador Renan Calheiros e das figuras mais influentes do governo federal, começando pelo presidente Lula, que ganha força com a aproximação de cada maratona eleitoral.
Diante desse cenário e de complicadas ‘articulações nos bastidores’ – como a indefinida nomeação da procuradora Marluce Caldas para o Superior Tribunal de Justiça – uma coisa é certa: JHC pode não ter nenhum motivo para ignorar o ‘incentivo’ de Artur Lira, mas tem mil razões para pensar primeiro na própria estabilidade política. Exatamente como está fazendo o herdeiro de Biu de Lira.